A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, aceitar nesta terça-feira (6) a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra integrantes do chamado “Núcleo 4”, acusados de envolvimento em uma tentativa de golpe de Estado para devolver o ex-presidente Jair Bolsonaro ao cargo. A denúncia, formalizada na Petição (Pet) 12100, passa agora para a fase de ação penal, sob relatoria do ministro Alexandre de Moraes.
Os sete denunciados — Ailton Moraes Barros (ex-major do Exército), Ângelo Denicoli (major da reserva), Giancarlo Rodrigues (subtenente), Guilherme Almeida (tenente-coronel), Reginaldo Abreu (coronel), Marcelo Bormevet (agente da Polícia Federal) e Carlos Cesar Moretzsohn Rocha (presidente do Instituto Voto Legal) — são acusados de propagar desinformação, atacar instituições democráticas e articular ações para desestabilizar o Estado.
Com a decisão, todos se tornam réus pelos crimes de tentativa de abolir, de forma violenta, o Estado Democrático de Direito; tentativa de golpe de Estado; participação em organização criminosa armada; dano qualificado por violência e ameaça grave ao patrimônio da União; e deterioração de bem tombado.
Segundo o STF, nesta etapa do processo, foi avaliado apenas se a denúncia cumpre os critérios mínimos exigidos pelo Código de Processo Penal. A conclusão foi de que há elementos que indicam a ocorrência de crimes e a possível participação dos envolvidos.
Milícia digital e manipulação de informações
O relator Alexandre de Moraes afirmou que a PGR apresentou provas suficientes de que o grupo criou uma estrutura organizada, descrita como “milícia digital”, com o objetivo de minar a confiança nas urnas eletrônicas, deslegitimar o processo eleitoral e incitar a população contra as instituições, preparando o terreno para um golpe.
Entre os elementos citados estão mensagens trocadas entre os investigados, ações de disseminação de fake news e a produção de um laudo fraudulento pelo Instituto Voto Legal para desacreditar as eleições de 2022. Esse laudo, mesmo sendo baseado em informações sabidamente falsas, foi amplamente divulgado por Carlos Cesar Moretzsohn Rocha em entrevistas e transmissões ao vivo.
Envolvimento individual dos acusados
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Ailton Barros teria recebido orientações de figuras do alto escalão do governo, como o ex-ministro Braga Netto, para atacar os comandos das Forças Armadas que se recusavam a apoiar o golpe.
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Ângelo Denicoli é apontado como autor de documentos falsos sobre o sistema eleitoral, atuando como elo entre criadores de desinformação e agentes de mídia que a propagavam.
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Giancarlo Rodrigues teria usado sua posição na Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para montar uma estrutura clandestina que monitorava opositores.
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Guilherme Almeida foi flagrado em vídeos e mensagens sustentando a tese de fraude eleitoral e incentivando atos antidemocráticos, como os protestos de 8 de janeiro de 2023.
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Reginaldo Abreu teria alterado relatórios do Exército para ajustá-los às narrativas golpistas, além de imprimir, dentro do Palácio do Planalto, documentos sobre um suposto “gabinete de crise”.
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Marcelo Bormevet, também ligado à Abin, teria usado recursos de inteligência para identificar alvos do grupo, sem qualquer relação com a segurança do Estado.
“Mentira como mercadoria”
Durante o julgamento, a ministra Cármen Lúcia afirmou que o caso mostra como a mentira foi transformada em produto comercial: “Paga-se por isso. Há quem compre e quem venda.” O ministro Luiz Fux reforçou que os indícios são robustos e que o processo deve esclarecer a dimensão das ações criminosas.
Outras denúncias
Este é o terceiro grupo denunciado pela PGR em um amplo inquérito que envolve Jair Bolsonaro e 33 de seus ex-integrantes e aliados. O STF já aceitou denúncias contra sete pessoas do Núcleo 1 e seis do Núcleo 2. A análise da acusação contra os membros do Núcleo 3 está prevista para os dias 20 e 21 de maio.