A Justiça Federal declarou nulas as licenças ambientais concedidas à Atem’s Distribuidora de Petróleo S.A. para construção e operação de um terminal portuário no Lago do Maicá. A sentença, assinada pela juíza Lais Durval Leite em 15 de setembro de 2025, suspendeu a continuidade da obra até a realização de um novo processo de licenciamento, com Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente (EIA/RIMA) e consulta às comunidades tradicionais.
A decisão resulta do julgamento conjunto de duas Ações Civis Públicas propostas pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelo Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), com apoio da Federação das Organizações Quilombolas de Santarém (FOQS). O processo questionava a validade das licenças emitidas pela Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas/PA), sob alegação de que foram concedidas sem observar normas nacionais e internacionais de proteção socioambiental.
Ausência de consulta às comunidades em Santarém
Um dos pontos centrais da sentença foi a omissão da Consulta Prévia, Livre e Informada (CPLI), prevista na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). O tribunal concluiu que a Semas/PA não realizou qualquer procedimento válido com quilombolas, indígenas e pescadores da região. O único ato identificado foi um ofício enviado à Fundação Cultural Palmares um dia antes da emissão das licenças, considerado insuficiente.
Comunidades próximas ao empreendimento, como Pérola do Maicá (1,2 km), Arapemã (4,1 km) e Saracura (7,6 km), não foram formalmente consultadas, apesar de estarem dentro da zona de influência estabelecida pela Portaria Interministerial nº 60/2015. A juíza destacou que visitas informais a moradores não substituem o processo de consulta previsto em lei.
Exigência de estudos ambientais completos
Outro fundamento para a anulação foi a dispensa do EIA/RIMA, substituído por relatórios simplificados (RCA e PCA). Para o juízo, esses documentos não avaliaram de forma adequada os impactos ambientais, sociais e culturais em uma região sensível e de uso tradicional por pescadores, quilombolas e povos indígenas.
Também não foram elaborados estudos específicos exigidos para empreendimentos desse porte, como o Estudo do Componente Quilombola (ECQ) e o Estudo do Componente Indígena (ECI). A decisão lembra que, em 2016, a Justiça já havia suspenso o licenciamento de outro porto no Lago do Maicá, da empresa Embraps, por falhas semelhantes.
O processo apontou ainda que a Atem’s dividiu os pedidos de licenciamento em dois procedimentos, um para cargas não perigosas e outro para combustíveis. A prática levantou suspeita de fracionamento indevido, mas a juíza entendeu que não houve provas de fraude ou dolo da empresa. Ainda assim, considerou que os dois empreendimentos compõem um mesmo projeto portuário, com impactos cumulativos sobre a mesma área.
Com a sentença, ficam suspensas as licenças ambientais LP nº 1.725/2019 e LI nº 2.903/2019, além das autorizações vinculadas ao processo 2019/17541. A obra não poderá prosseguir até que um novo processo de licenciamento seja conduzido, com participação das comunidades e elaboração dos estudos técnicos exigidos.
O pedido do MPF e MPPA para demolição das estruturas já construídas foi negado. A juíza considerou a medida desproporcional neste momento, avaliando que as edificações podem ser aproveitadas caso o empreendimento venha a ser regularizado no futuro, desde que atendidas as exigências ambientais e sociais.
Dano moral coletivo
Tanto o MPF quanto o MPPA pediram indenização por dano moral coletivo, mas a solicitação foi rejeitada. A magistrada entendeu que, embora houvesse irregularidades, elas não configuraram lesão grave e intolerável a valores fundamentais da sociedade, requisito para esse tipo de condenação.
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