O Ministério Público Federal (MPF) recorreu, nesta terça-feira (15), ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), em Brasília (DF), contra a decisão da Justiça Federal no Pará que negou o pedido de suspensão imediata dos efeitos do contrato de créditos de carbono firmado entre o estado do Pará e uma coalizão de governos estrangeiros e corporações multinacionais.
No recurso, o MPF reafirma a urgência da medida, alega que a decisão judicial foi equivocada e apresenta novos fatos que reforçam o risco de dano irreparável a povos e comunidades tradicionais. A ação inicial foi ajuizada em 3 de junho e pede a anulação do contrato, argumentando que ele configura uma venda antecipada de créditos de carbono — prática vedada pela Lei nº 15.042/2024 — e que não houve consulta prévia, livre e informada (CPLI) às populações impactadas.
No entanto, em 9 de junho, a Justiça Federal negou o pedido liminar, ao entender que o MPF não comprovou a urgência da suspensão e que o contrato prevê cláusulas de salvaguarda, como a realização de consulta “quando e se aplicável”, a critério técnico e jurídico da instituição vendedora dos créditos.
No recurso, o MPF contesta essa avaliação e sustenta que o perigo da demora é concreto, uma vez que o contrato já está em vigor e pressiona a implementação acelerada do sistema estadual de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (REDD+) no Pará, a tempo da realização da COP 30. Segundo o órgão, isso atropela o processo de deliberação das comunidades envolvidas.
Além disso, o MPF destaca que a cláusula de salvaguarda não supre a ilegalidade do processo, já que a consulta deveria ter ocorrido antes da assinatura do contrato e da fixação do preço (US$ 15 por tonelada de crédito futuro). Qualquer tentativa de consulta posterior, argumenta o órgão, “torna-se mera formalidade, esvaziando o próprio conteúdo da CPLI”.
Para reforçar a urgência, o MPF apresentou novos fatos surgidos após o ajuizamento da ação, como uma nota técnica da organização Terra de Direitos e os relatos debatidos em um evento realizado em 17 de junho, na sede do MPF em Belém. Entre os principais problemas apontados, estão:
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Coerção e assédio: denúncias de que o acesso a políticas públicas, como o programa Minha Casa, Minha Vida e a titulação de terras, estaria sendo condicionado à aceitação do protocolo de consulta elaborado pelo estado;
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Consulta tardia e viciada: a suposta consulta foi iniciada após a pré-venda dos créditos, funcionando apenas como mecanismo para validar decisões já tomadas;
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Desrespeito aos costumes: o processo foi considerado “demasiadamente rápido”, ignorando os tempos próprios de organização das comunidades;
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Sub-representação: o plano de consulta contempla um número restrito de participantes, deixando de fora grupos como ribeirinhos e quebradeiras de coco babaçu.
No pedido ao TRF1, o MPF solicita que a decisão de primeira instância seja reformada, com a suspensão imediata dos efeitos do contrato, além da suspensão temporária da elegibilidade do Pará para receber recursos do mercado de carbono. O órgão também requer que a União seja impedida de autorizar o estado a atuar junto a certificadoras internacionais até que o sistema de créditos esteja adequado à legislação vigente.
Os pedidos estão registrados nos processos nº 1025858-14.2025.4.01.3900 e nº 1025477-66.2025.4.01.0000.