O ministro Gilmar Mendes, decano do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu nesta quarta-feira (3) diversos dispositivos da Lei do Impeachment (Lei 1.079/1950) relacionados ao afastamento de ministros da Corte. A decisão foi proferida no âmbito das Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) 1.259 e 1.260, apresentadas pelo partido Solidariedade e pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB).
Segundo o ministro, vários trechos da legislação de 1950 não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988. Entre os pontos suspensos estão regras sobre o quórum para abertura de processo de impeachment contra ministros do STF, a legitimidade para apresentação de denúncias e dispositivos que permitem interpretar divergências judiciais como crime de responsabilidade. A decisão será submetida a referendo do Plenário.
Instrumento de controle e riscos de intimidação
No despacho, Gilmar Mendes fez um resgate histórico do impeachment como mecanismo de controle entre Poderes, mas enfatizou que o instituto não pode ser utilizado como ferramenta de intimidação contra magistrados. Para ele, processos infundados representam ameaça ao Estado de Direito e comprometem a independência judicial.
“O impeachment infundado de ministros da Suprema Corte se insere no contexto de enfraquecimento institucional. Ao buscar a destituição de um juiz da Corte, não se questiona apenas sua conduta, mas mina-se a confiança pública nas instituições que garantem a separação de Poderes”, afirmou.
Quórum para abertura do processo
Gilmar Mendes considerou inconstitucional a regra da Lei 1.079/1950 que prevê maioria simples para abertura de processo de impeachment contra ministros. Para os autores das ações, permitir que 21 senadores deem início ao procedimento — número inferior ao exigido para aprovar a nomeação de um ministro — viola garantias como vitaliciedade e independência funcional.
Para o ministro, o quórum reduzido fragiliza a autonomia do Judiciário e coloca o STF em posição de dependência perante o Legislativo. Ele definiu que o quórum adequado para abertura do processo deve ser de dois terços do Senado.
Legitimidade para denúncia
O decano também suspendeu o artigo 41 da Lei do Impeachment, que autoriza qualquer cidadão a apresentar denúncia contra ministros do Supremo. Na avaliação de Mendes, a regra incentiva denúncias motivadas por interesses políticos, sem rigor técnico e baseadas apenas em discordâncias interpretativas.
Ele defendeu que a iniciativa deve ser exclusiva do Procurador-Geral da República (PGR), responsável por avaliar a consistência jurídica necessária para instauração do procedimento.
Mérito das decisões e afastamento cautelar
O ministro reafirmou que divergências interpretativas não configuram crime de responsabilidade. Dessa forma, não é possível abrir processo de impeachment baseado exclusivamente no conteúdo das decisões judiciais — o chamado “crime de hermenêutica”, vedado pela jurisprudência do STF.
A decisão também acompanhou parecer da PGR que apontou a impossibilidade de afastamento cautelar de ministros, uma vez que, ao contrário do presidente da República, membros do STF não possuem substitutos diretos, o que poderia comprometer o funcionamento da Corte.
Garantias processuais
Gilmar Mendes rejeitou o pedido da AMB para aplicar a Lei Orgânica da Magistratura (Loman) ao impeachment de ministros, entendendo que o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório já estão assegurados pela Lei do Impeachment e pelo Regimento Interno do Senado.


