A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (5) o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 3/2025, que susta a Resolução 258/2024 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda). A norma trata do atendimento a crianças e adolescentes vítimas de violência sexual e estabelece diretrizes para acesso ao aborto legal. O texto segue agora para análise do Senado.
O projeto é de autoria da deputada Chris Tonietto (PL-RJ) e outros parlamentares. O relator, deputado Luiz Gastão (PSD-CE), apresentou parecer favorável, argumentando que a resolução extrapola as competências do Conanda e contraria dispositivos do Código Penal.
Pontos da resolução contestados
A Resolução 258/24 dispensa a exigência de boletim de ocorrência, autorização judicial ou permissão de pais e responsáveis para a interrupção da gravidez em casos de suspeita de violência sexual praticada no ambiente familiar. O texto também orienta que, em caso de conflito entre a vontade da criança e a de seus responsáveis, profissionais de saúde acionem a Defensoria Pública e o Ministério Público para orientação legal.
Os autores do PDL sustentam que a ausência de exigência de boletim de ocorrência e a relativização do consentimento dos responsáveis confrontam o ordenamento jurídico, uma vez que crianças e adolescentes são civilmente incapazes e, pelos termos do Código Penal, decisões dessa natureza cabem a seus tutores legais.
Outro ponto criticado é o dispositivo que classifica como conduta discriminatória — e não objeção de consciência — a recusa médica baseada na desconfiança sobre o relato da vítima.
Debate sobre limite gestacional
O relator enfatizou a ausência de um marco temporal para a realização do aborto na resolução. Segundo ele, a falta de limitador poderia permitir a interrupção da gravidez em estágios avançados, próximos a 40 semanas, o que diverge da prática internacional.
“Mesmo países que permitem o aborto de maneira ampla estabelecem limites temporais. Ignorar a viabilidade fetal extrauterina, possível a partir de 24 semanas com suporte neonatal, colide com a proteção legal ao nascituro”, afirmou Gastão.
Posicionamentos em plenário
A deputada Chris Tonietto afirmou que a norma representa “usurpação de competência” e criticou a dispensa de boletim de ocorrência.
“A violência sexual não se combate com outra violência. Não se combate sem segurança pública e nem sem registro do crime”, declarou.
O líder do PL, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), também afirmou que o conselho não tem atribuição para legislar sobre aborto, enquanto Otoni de Paula (MDB-RJ) classificou a resolução como mecanismo de estímulo à “cultura da morte”.
Por outro lado, parlamentares contrários ao PDL defenderam a manutenção da resolução. A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) argumentou que, em numerosos casos, o agressor é pessoa do núcleo familiar, razão pela qual a autorização parental nem sempre seria uma salvaguarda.
“Ninguém faz apologia ao aborto. Trata-se de garantir um direito já previsto em lei”, afirmou.
Já o deputado José Airton Félix Cirilo (PT-CE) criticou a polarização moral em torno do tema e ressaltou dados sobre violência sexual infantil.
“A cada dia, ao menos uma criança é estuprada no meu estado. A resolução busca proteger essas vítimas, não desampará-las”, disse.
Próximos passos
Com a aprovação na Câmara, o PDL 3/2025 segue para o Senado. Caso confirmado pelos senadores e promulgado pelo Congresso, o decreto legislativo terá efeito imediato para sustar a resolução do Conanda, que deixará de produzir efeitos.
O caso intensifica o impasse legislativo e jurídico sobre os limites regulatórios do aborto legal no Brasil, especialmente em casos envolvendo menores de idade, e promete novos embates no parlamento e no Judiciário.


