A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa de Roraima (ALERR), que investiga denúncias de sobreposição de terras no estado, realizou mais uma rodada de oitivas nesta quinta-feira (4), no plenário Deputada Noêmia Bastos Amazonas. Durante a sessão, o engenheiro civil Jhonatan da Silva Tomáz teve sua condição alterada de testemunha para investigado.
A mudança ocorreu após denúncia apresentada pela Associação dos Agricultores Familiares do Projeto de Assentamento Ajarani contra técnicos do Instituto de Terras e Colonização de Roraima (Iteraima). A entidade acusa os servidores de facilitar a grilagem de áreas no Sul do estado e aponta Jhonatan e o colega Janderson Lúcio como responsáveis por cobrar valores para serviços de georreferenciamento na vicinal “Zé Valdo”, localizada na Gleba Equador, em Rorainópolis.
Questionado pelo relator da CPI, deputado Renato Silva (Podemos), sobre suposta sociedade ou parceria com Janderson, Jhonatan negou. No entanto, apresentou contradições: em alguns momentos afirmou não ter ido à região, em outros confirmou visita, mas disse não se lembrar da data. Também rejeitou ter indicado o servidor para formalizar serviços.
“Fui fazer vistoria na vicinal ‘Zé Valdo’. Na época havia conflito entre técnicos e divergências nos limites dos lotes. No Iteraima temos uma lista de profissionais credenciados, passei alguns nomes, mas não foi só ele [Janderson]. A associação comparou valores e contratou, mas nada passou por mim em termos de pagamento”, declarou.
O engenheiro ainda foi questionado sobre possíveis favorecimentos a processos de regularização relacionados a Gabriel Prestes, filho do governador Antônio Denarium (Progressistas). Diante de contradições e documentos que indicam negociação de preços, formação de sociedade e uso do nome do Iteraima em serviços externos, o relator pediu a inclusão de Jhonatan como investigado.
“Ele mesmo confirmou que procurou os colonos, ofereceu o serviço, negociou o preço. Então, claramente o Jonathan se tornou investigado e vai ser indiciado pela CPI”, afirmou Renato Silva.
Conflito no Rio Pretinho
Na mesma sessão, o presidente da Coopeagro Rio Pretinho, Valmir Evaristo de Andrade, denunciou ameaças contra agricultores da bacia do Rio Pretinho, na Vila do Jundiá, em Rorainópolis. Segundo ele, cerca de 30 produtores aguardam desde 2017 a regularização de terras pelo Incra, que, à época, não poderia transferir a gleba porque ainda não havia sido repassada ao Estado.
“O Incra não poderia, à época, regularizar as terras, pois elas estavam em processo de transferência. Fui funcionário do órgão por quase 37 anos e passei toda a minha vida na área de cartografia combatendo esse tipo de irregularidades. Não tive resultados, porque o Incra se omitiu informando que o Iteraima seria o responsável para resolver a demanda”, relatou.
De acordo com Andrade, em 2020 os produtores enfrentaram sobreposição de áreas e, mais recentemente, a chegada de novos compradores que iniciaram construções, destruíram casas e passaram a ameaçar moradores.
O presidente da CPI, deputado Jorge Everton (União), informou que a equipe técnica analisará a situação. Ele destacou que a titulação exige requisitos legais, como marco temporal e produção efetiva da área.
“Em tese, pelo que o senhor relatou, nem a associação teria direito às terras e nem os invasores. Trata-se de uma área que deveria ser arrecadada pelo Estado para, conforme a necessidade de utilidade pública, ser transformada em um projeto de assentamento destinado aos moradores originais ou, então, disponibilizada em leilão, com preferência àqueles que comprovarem a posse do lote”, explicou Everton.
A reunião foi transmitida ao vivo pela TV Assembleia (canal 57.3) e pelo YouTube oficial da Casa.
Sobre a CPI
Instaurada em 20 de fevereiro de 2025, por meio do Ato da Presidência nº 003/2025, a CPI da Grilagem de Terras investiga a atuação de uma possível organização criminosa responsável pela ocupação irregular de terras públicas em áreas urbanas e rurais de Roraima. As apurações abrangem as glebas Baliza, Equador, Ereu, Cauamé e PDA Anauá.
Em pouco mais de seis meses, a comissão já colheu diversos depoimentos e apurou denúncias de grilagem, ameaças, agressões e danos contra pequenos produtores.