O Tribunal de Contas do Estado de Rondônia (TCE-RO) responsabilizou o governador Marcos Rocha por 11 irregularidades administrativas durante o exercício de 2024 e concedeu prazo de 30 dias para que o chefe do Executivo apresente defesa. A decisão, assinada pelo conselheiro Paulo Curi Neto no último dia 30 de julho, abrange desde despesas públicas irregulares até falhas estruturais nas áreas de saúde, educação e meio ambiente, além de descumprimento de determinações anteriores da Corte.
Entre os achados considerados mais graves estão a realização de despesas sem prévio empenho e sem cobertura contratual, ausência de transparência sobre valores inscritos em dívida ativa e fragilidades na governança da dívida pública. Também foi identificado risco crescente à sustentabilidade fiscal do estado, impulsionado pelo aumento do déficit atuarial do regime previdenciário dos servidores (RPPS), baixa rentabilidade dos investimentos e ausência de medidas de custeio para conter as despesas.
Saúde pública colapsada e obra do HEURO paralisada
Na área da saúde, o TCE constatou que o Estado de Rondônia tem transferido responsabilidades de média e alta complexidade (MAC) para os municípios, que acabam arcando com custos que não lhes cabem, em prejuízo da atenção primária (APS). Essa sobrecarga, segundo o relatório, compromete a sustentabilidade do SUS e expõe a população a riscos.
A situação se agrava com o atraso na construção do novo Hospital de Urgência e Emergência de Porto Velho (HEURO). O contrato inicial de R$ 1,04 bilhão foi rescindido sem aplicação de penalidades e a obra, que deveria ser entregue em novembro de 2024, está paralisada e sem previsão de conclusão. Até a suspensão, menos de 5% das obras haviam sido executadas. Enquanto isso, o Hospital João Paulo II continua operando em condições críticas, com superlotação seis vezes superior à capacidade, segundo fiscalizações do próprio TCE.
Falhas na assistência materno-infantil
Outro ponto crítico identificado é a fragilidade na atenção pré-natal e na rede materno-infantil, com riscos elevados de mortalidade materna e neonatal. Em 2024, 4,62% das gestantes não realizaram nenhuma consulta pré-natal e 25,48% iniciaram o acompanhamento após a 12ª semana de gestação. A taxa de prematuridade é de 11,86%, e o índice de cesarianas atinge 71,3%, muito acima do recomendado.
Além disso, 13,83% dos partos ocorreram em adolescentes, com 0,49% em meninas de 14 anos ou menos. O Estado também não oferece urocultura pelo SUS, obrigando mais de 90% das gestantes a recorrer à rede privada, o que contribui para casos de sepse neonatal e óbitos evitáveis.
Educação em colapso: apenas 4% dos alunos têm aprendizado adequado em Matemática
No setor educacional, os dados do Sistema de Avaliação Educacional de Rondônia (SAERO 2024) revelam um quadro alarmante: apenas 4% dos alunos da 2ª série do Ensino Médio têm aprendizado adequado em Matemática. No 9º ano do Ensino Fundamental, esse percentual é de 9%. A maioria das regionais foi classificada como “Abaixo do Básico”, indicando um colapso estrutural do ensino.
O TCE também apontou má gestão do programa de alfabetização PROALFA. Dos 26 produtos previstos, apenas quatro foram concluídos dentro do prazo. A falha na execução compromete ações essenciais como formação de professores e distribuição de materiais didáticos.
Meio ambiente: desmatamento atinge 471 mil hectares
Na área ambiental, o tribunal constatou falhas na gestão das Unidades de Conservação (UCs) estaduais. Cerca de 18% da área total das UCs é usada irregularmente para atividades agropecuárias, incluindo áreas de proteção integral. O desmatamento acumulado ultrapassa 471 mil hectares, com destaque negativo para a Estação Ecológica Soldado da Borracha e a Reserva Extrativista Jaci-Paraná, ambas com mais de 50% de suas áreas desmatadas.
Além disso, em 2024, as queimadas atingiram mais de 1 milhão de hectares, o equivalente a 45% da área total das UCs. A fiscalização da Secretaria de Desenvolvimento Ambiental (SEDAM) foi considerada insuficiente, apesar do aumento nas autuações.
Descumprimento de determinações anteriores
O TCE também apontou o não cumprimento integral de determinações expedidas em exercícios anteriores, entre elas a ausência de estudo técnico sobre a situação financeira da Companhia de Águas e Esgotos de Rondônia (CAERD) e falhas nos controles internos sobre despesas públicas. O tribunal alerta que tais omissões podem agravar o cenário fiscal do estado.
Próximos passos
O governador Marcos Rocha será formalmente notificado para apresentar defesa por meio eletrônico. Caso não esteja cadastrado no Portal do Cidadão do TCE, a notificação será feita de forma presencial, e, em última instância, por edital. A resposta será analisada pela área técnica e pelo Ministério Público de Contas antes da emissão de parecer final sobre a prestação de contas de 2024.